domingo, 17 de março de 2013

Análise: Set The World Afire (Megadeth)


Set The World Afire
Megadeth – Álbum: So Far So Good So What (1988)

Red flash, clouds choking out the morning sky
They said it'd never come, we knew it was a lie
All forms of life die now, humans all succumb
Time to kiss your ass goodbye, the end has just begun
 
Distorted figures walk the street, it's 1999
Weeds once underneath your feet have grown to vines
Bodies melted like a candle, a land without a face
No time to change your fate, no time left, it's too late

 The arsenal of Megadeth can't be rid they said
And if it comes the living will envy the dead
Racing for power and all come in last
No winning first stone cast
This falsehood worldly peace
It's treaties will soon cease
No one will be left to prove that humans existed
Maybe soon the children will be born open fisted
We all live on one planet it will all go up in smoke
 
Too bad they couldn't see this lethal energy
And now the final scene, a global darkening

Dig deep the piles of rubble and ruins
Towering overhead both far and wide
There's unknown tools of World War III
Einstein said "We'll use rocks on the other side"
No survivors!
 
Set the world afire! 

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(Tradução) Um mundo sob as chamas

Flash Vermelho, Nuvens se chocando no céu da manhã
Eles falavam que isso nunca iria chegar, nós sabiamos que isso era mentira
Todas as formas de vida morreram agora, todos os humanos sucumbem
Hora de chutar sua bunda e dizer adeus, o fim apenas começou

Figuras distorcidas andam nas ruas, isto é 1999
Infestantes de uma vez, nasceram e cresceram vinha em seus pés
Corpo derretido como uma vela , como uma terra sem face
Sem tempo para mudar sua raça, não resta tempo, é tarde demais

O arsenal do Megadeth não pode se livrar, disseram
E quando se tratar dos vivos, eles invejarão os mortos
Corrida de poder e todos por último
Nenhum vencedor na primeira pedra
Essa falsidade de paz mundial
Esses tradados em breve cessarão
Ninguém será deixado vivo para provar que humanos existiram
Talvez em breve as crianças vão nascer sendo abertas
Todos nós vivemos num planeta que vai virar fumaça

Tão mal que eles mal podiam ver esta letal energia
E agora na cena final, o globo vai se escurecendo

Cavando fundo, pilhas de escombros e ruínas
em direção acima da cabeça ambos longe e ampla
São desconhecidas as armas da III Guerra Mundial
Einstein Disse:"Todos nós usaremos pedras no outro lado"
Nenhum sobrevivente!!!

Um mundo sob as chamas!

Análise da Canção:

Esta música é a primeira composição de Dave Mustaine, mas curiosamente só saiu no 3º álbum da banda, em 1988, e inicialmente teria o nome de "Megadeth". 
O mundo em que ele cresceu (anos 70 e 80) foi um mundo onde a ameaça nuclear era cotidiana. Tanto que isso se reflete em suas letras, como essa, Dawn Patrol,  Rust In Peace e Black Curtains.
Os anos do governo Reagan nos EUA (jan/1981 à jan/1989) foram os anos finais da Guerra Fria, onde o presidente estadunidense acirrou o conflito contra o combalido Estado Soviético. Mas ainda assim, havia o medo da retaliação da URSS.
Dentro desse contexto, a letra conta aos “sobreviventes” sobre como foi a III Guerra Mundial, depois que EUA e URSS apertaram os botões de destruição em massa.

A utilização como música incidental a canção “I Don't Want To Set the World On Fire" (1941) do grupo vocal americano chamado The Ink Spots, nos faz imaginar uma pacata fazendo no interior dos EUA, onde as pessoas calmamente ouvem no seu radinho de pilha a linda canção. De repente ouve-se o efeito sonoro de um sibiliar de uma bomba e uma explosão em seguida. Entram os riffs frenéticos. Essa construção inicial da música mostra exatamente o que era o medo da Guerra Nuclear: ninguém em nenhum lugar estaria salvo. E mais, de repente tudo estaria destruído. Isso fica evidente logo na primeira frase da letra: "Red flash, clouds choking out the morning sky"

Com guitarras rápidas, bateria pulsante e uma linha de baixo que dá corpo à construção musical, o ouvinte recebe uma avalanche sonora. Os músicos executam com extrema velocidade e maestria arranjos muito complexos.O ouvinte é convidado a experimentar a dureza de um mundo destruído, que é sugerida pela letra da canção. Não haveria jeito de cantar sobre o fim do mundo de uma forma delicada e tranquila. 


O "eu" poético pode ser entendido como alguém que assiste ao fim do mundo anunciado. A frase "They said it'd never come, we knew it was a lie" deixa essa sensação explícita para o ouvinte, e mostra novamente a paranóia de conviver com o medo da aniquilação em massa. (HOBSBAWN, 1995, p. 224). As pessoas não confiavam nos governos do EUA nem da URSS quando falavam em "distensão" ou "paz", pois só haveria paz se realmente houvesse o desarmamento de ambos os lados.

A letra ainda faz referência ao milenarismo, quando cita "Distorted figures walk the street, it's 1999". A crença do final do mundo sempre aumenta no final dos milênios. Foi assim em boa parte da Europa cristã em 999, quando o movimento das Cruzadas ganhou enorme força movido pela crença do Apocalipse milenar. Aqui a letra apresenta essa mesma preocupação, utiliza a proximidade do ano 2000 (a música é de 1988) para criar um clima apocalíptico. 

A linha "The arsenal of Megadeth can't be rid they said", vem de um panfleto vinculado pelo senador da Califórnia, Alan Cranston, que diz: "Não é simples se livrar do arsenal de Megamorte, disseram, não importa o que os tratados de paz chegaram." (Megadeath = 1 milhão de mortes; terminologia utilizada em ocasiões onde as mortes se contam nas casas dos milhôes, como na guerra; que gerou a corruptela para o nome da banda). 

A canção deixa bem claro que não acredita na "falsidade da paz mundial", e fala sobre as consequencias do ataque nuclear. Com detalhes horripilantes, primeiro cita os efeitos iniciais do ataque nuclear, com pessoas derretidas como vela, em formas inumanas. Depois fala sobre o cenário de total destruição gerado pelas bombas. As cidades em ruínas, citadas na linha  "Dig deep the piles of rubble and ruins".

Há referência de Albert Einstein na linha: "There's unknown tools of World War III / Einstein said 'We'll use rocks on the other side". Perguntado se saberia responder que tipo de armas as potências mundiais usariam em uma eventual Terceira Guerra Mundial, Einstein disse: “Não sei. Mas na Quarta Guerra Mundial, usaríamos paus e pedras”.

A música tem riffs frenéticos e mantém o tom apocalíptico, trazendo a fúria e a angustia como sentimentos despertos nos ouvintes.Tem muitas quebras noandamento, que variam entre acelerado e muito acelerado, e ajudam a criar um clima tenso e raivoso. A técnica vocal do Dave Mustaine nesse período está em cantar de forma agressiva, quase como se estivesse “rosnando” ao invés de cantar. É como uma voz que grita que não há esperança para um mundo destruído pela guerra. Os vocais recebem efeitos em algumas frases, como na segunda estrofe, como se viesse de formas de vidas não humanas, dando ênfase  ao que diz a letra.


Dave Mustaine é grande apreciador de HQs, e não é desprezível que a descrição dele sobre o conflito na letra de sua música, seja influenciada por histórias como Batman – O Cavaleiro das Trevas(1986) e Watchmen (1986). Se percebermos essas histórias, existem semelhanças muito expressivas entre a forma em que os quadrinhos contam um eventual ataque nuclear, e a letra de Mustaine.

"Set World Afire" figura como um grande clássico do Megadeth, e nos conta um mundo à beira da destruição. Alguns críticos dizem que esse tipo de música é datada, porque ela fazia sentido quando era cantada em 1988, quando o mundo ainda vivia a Guerra Fria, mas que passados 25 anos a canção perderia o seu sentido. É nesse ponto que o historiador se apropria da música como documento, exatamente para analisa-la como registro vivo de um período, captando suas nuances e desdobramentos. É nesse instante que a história encontra a música, para poder dar-lhe sentido e trazer o discurso novamente à luz. Para que possamos entender o contexto em que a obra foi criada, e decodigicar os signos contidos nela. Quando conseguimos fazer isso, percebemos que temos uma obra atemporal, com valores culturais que não se perdem com o passar dos anos.


Referências bibliográficas:

BARROS, José D’Assunção. O campo da História: especialidades e abordagens. Petrópolis, Editora Vozes, 2004

GUARINELLO, Norberto L. História científica, história contemporânea e história cotidiana. Revista Brasileira de História, São Paulo, v24, n.48, 13-38, 2004.

HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos: O Breve Século XX (1914-1991). São Paulo; Companhia das Letras, 1995.

KRAKHECKE, Carlos André. A Guerra Fria da década de 1980 nas Histórias em Quadrinhos Batman – O Cavaleiro das Trevas e Watchmen. Revista eletrônica História, imagem e narrativa. disponível em: <www.historiaimagem.com.br >. Acesso em: 23 mai. 2010.

NAPOLITANO, Marcos. A História depois do papel. In PINSKY, Carla Bassanezi (org.) Fontes Históricas. 2ª Edição, São Paulo: Contexto, 2010.

______. História e Música: História cultural da música popular. 3ª Ed. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2005.
 

<www.megadethbrasil.com >. Acesso em: 06 jun 2010

5 comentários:

  1. Parabéns pela excelente ideia Rodrigo.
    Já fico aqui ansioso pelo próximo post.
    Também sou historiador e headbanger. Minha trajetória acadêmica até aqui enveredou para outros lados, mas no doutorado pretendo trabalhar com metal.
    Vamos manter contato e trocar ideias.

    Um abraço

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    1. HELLo!

      Com certeza quero fazer contato, trocar informações, conhecimento e impressões. É uma das metas do Blog.
      Estou muito feliz com a repercussão, e com o retorno das pessoas.

      Espero que continue curtindo, e se quiser, colaborando. Se tiver algum material, seria muito legal de trocarmos esse conhecimento.

      Estou à disposição para contato!

      Abraços!!!

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  2. Muito bom Rodrigo, parabéns pelo dom com as palavras, e parabéns pela postagem ontem no whiplash: http://whiplash.net/materias/curiosidades/178306-megadeth.html

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    1. E aí, Carlão!

      Pô, nem preciso falar nada, né?! É uma honra ter seu comentário sobre o post, e principalmente, é imprescindível contar com a força e colaboração dos amigos. Você sabe que o tempo é curto para dedicar-me a este espaço, mas a boa recepção e o carinho de todos tem me deixado muito animado.

      Valeu Irmão! Por estamos sempre juntos!

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  3. Estou estonteado com este artigo, bem feito demais, recheado de informações e escrito por quem realmente gosta de boa música!

    Parabéns, Rodrigo Lourenço Costa. Você é o cara!

    Megadeth!

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